Passei minha manhã mexendo em alguns cadernos antigos em busca de alguma inspiração. Uma revista importante havia me convidado para escrever um artigo, e travei na metade do texto.
Folheei delicadamente as amareladas páginas de um diário que escrevi dois anos atrás, encontrando anotações tenebrosas de uma fase complicada da minha vida.
Encostei-me na parede, acariciando o pelo do meu gato, enquanto ele dormia preguiçosamente ao meu lado, e comecei a ler…
Respirei várias vezes, tentando acalmar os batimentos acelerados do meu coração. Havia um nó na minha garganta, a cabeça cheia de pensamentos confusos que me deixavam tonta e sem conseguir entendê-los, minhas mãos tremiam e meu corpo ficava fraco a cada segundo.
Eu apenas queria que aquele dia acabasse logo, que eu conseguisse deitar minha cabeça no travesseiro e dormir, desejando que aquelas sensações desaparecessem e não voltassem nunca mais.
Sorri pela milésima vez, fingindo estar tudo bem.
Fingir!
Era o que eu sabia fazer de melhor nessa vida sem graça.
Eu tinha consciência de que a culpa daquela crise de ansiedade era minha, fui eu quem me colocou naquela situação. Eu sabia que não era uma boa ideia, porém insisti. E,naquele momento, precisava arcar com as consequências como a adulta que eu era, ou melhor, que eu deveria ser.
“Você não faz nada certo! Será que algum dia conseguirá tomar uma única decisão que não seja por impulso?”
Aquela maldita voz me castigava ao ficar repetindoaquelas coisas. Tentar silenciá-la era quase impossível, eu era obrigada a ouvi-la repetir isso dezenas de vezes. Aquilo não me ajudava em nada.
Faltavam poucos minutos para aquele dia acabar, eu podia aguentar mais alguns minutos.
“Sorria. Ninguém pode saber o que está acontecendo dentro de você. Sorria!”
— Pode me ajudar? — a cliente pediu com seu jeito impaciente. Eu apenas concordei, esforçando-me para ser simpática.
O expediente havia finalmente acabado. Respirei fundo, sentindo o ar gelado daquela noite invadir minhas narinas e continuei meu caminho até em casa.
Ainda não compreendia qual era o meu problema. Por que eu não podia ser uma pessoa normal, que conseguia trabalhar sem ter crises, aparentemente sem motivo algum, durante o trabalho? Eu me sentia tão deslocada, a sensação era de que nunca me encaixaria em lugar nenhum.
As pessoas acordavam cedo, iam para seus trabalhos, passavam o dia todo lá, voltavam para a casa à noite; tudo seguia naturalmente, como um rio fazendo seu caminho.
Eu literalmente não me encaixava naquilo!
Sentia-me tão incompleta, não tinha uma paixão a qual me dedicar, não sabia o que era trabalhar com o que me desse prazer. Sufocava-me estar em um lugar que não me agradava, que não me fazia feliz.
No entanto, a pior parte era saber que em menos de três anos tive quatro empregos e não me senti bem em nenhum. Foram trajetórias relâmpagos! Eu acreditava que sair era a melhor opção, já que em breve encontraria algo que fizesse sentido em minha vida.
Receber o salário no final do mês não era o bastante para me completar. Eu queria mais, eu queria a satisfação e não conseguia tê-la.
Contudo, como a boa cabeça dura que eu era, resolvi tentar de novo. E novamente, lá estava eu quebrando a cara em algo de que não gostava. Se fosse apenas isso, dava para aguentar, porém o problema estava na minha saúde. Esta não colaborava em nada.
A ansiedade me abraçava, dizendo que ficaria comigo até o final, fazendo o processo todo ser uma tortura.
Eu apenas queria ser normal.
Encontrar minha paixão era minha meta de vida. No entanto, passei a acreditar ser uma missão impossível.
Abri a porta da minha casa e fui recebida pelos miados calorosos do meu bichano. Sininho era o gato mais fofo e bonzinho que já conheci. Talvez seja por todo o sofrimento que passou antes de ser adotado por nós. Sinto seu carinho como agradecimento, contudo, quem deveria agradecê-lo era eu, já que me fazia muito feliz.
Após colocar ração em sua tigela, tomei um banho e me deitei no sofá. Minutos antes, eu havia conversado com meu marido e me esforcei em enxergar a situação em seu ponto de vista, contudo, a decisão estava tomada. Sempre recorri à única alternativa que considerava ser a melhor, enfrentar todo esse problema estava fora de cogitação. Eu não tinha forças e não acreditava ser possível conseguir.
Mesmo sabendo que seria motivo para outra crise de ansiedade, eu precisava falar com meu chefe e pedir demissão.
Mais um emprego, mais uma oportunidade que jogaria no lixo por não ser capaz de lidar com ela.
Respirei fundo após terminar a leitura, sentindo na pele o que passei naquele momento. Normalmente evitava ler o que eu escrevia quando não estava bem. Eu colocava muita carga negativa e reler aquelas palavras me fazia mal.
Coloquei o caderno de volta na caixa de lembranças e resolvi dar uma volta. Precisava limpar minha mente daquelas lembranças para poder escrever o artigo.
Eu insistia em guardar aqueles cadernos por eles conterem momentos felizes, porém também escrevi sobre as situações tristes pelas quais passei. Às vezes me esquecia disso.
Naquela época, não foi fácil encontrar minha paixão, aproveitei o tempo em casa para tentar descobrir do que eu gostava de fazer. Encontrar-me na escrita foi libertador e era ali que eu queria ficar.
Eu apenas deveria ter cuidado com alguns gatilhos que encontraria pelo caminho em busca de inspiração.
Ansiedade, de Regiane Silva.
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